Luiz Henrique Mandetta é um abnegado. Se não é, está. Mas talvez seja mesmo.
Tenho um amigo que, como ele, é ortopedista. Certa vez, entre umas e outras – lá se vão uns quinze anos – brincou festejando o futebol ter voltado à voga. Molecada se estrupia e o consultório lota. E com efeito, sua conta bancária agradece.
Daà que Mandetta ter posto de parte o consultório particular para se dedicar à PolÃtica, à coisa pública, para mim é prova de abnegação.
Na crise do Covid-19 o ministro juntou o técnico e o polÃtico. Tem se saÃdo bem no todo. Quem tem chefe sabe como é difÃcil. Quem tem chefe cretino, mais ainda. E todos podem imaginar com clareza como é ter Jair como chefe.
É feliz a combinação do doutor ortopedista com o polÃtico gestor de crise. Apalpa áreas sensÃveis pelo melhor tratamento, tomando cuidado de minimizar a dor. Assim procede o ministro, segurando a bronca na Esplanada e palmeando poderes polÃticos, financeiros, judiciário e a aflição da sociedade.
No sábado o doutor fez um apelo à maior participação das empresas no combate à pandemia. Nominou os três bancões privados Itaú-Unibanco, Bradesco e Santander. Pela agilidade que a iniciativa privada tem e o governo não, eles podem importar testes sem tanta burocracia. E parece que assim o farão: importarão cinco milhões de testes, respiradores e outros insumos hospitalares.
Papel de ministro é dizer assim, com jeito, na manha, qual o ortopedista que apalpa uma fratura. Mas nós, a sociedade, podemos e devemos apertar sem dó.
Doações são importantes, beleza, que venham. Mas é pouco. Muito pouco. Itaú-Unibanco, quando da fusão, tiveram perdoados pelo CARF R$ 25 bilhões em impostos devidos ao Tesouro. Qualquer coisa aquém deste montante neste momento é esmola, ou pior que esmola, porque ofende.
Para os municÃpios, na linha de frente, no contato imediato com a população, também temos pendências em haver. Aqui em São Paulo, minha casa, os bancões deviam fortunas em ISS, graças à chicana de registrar serviços em CNPJ de cidades vizinhas que despudoradamente entraram na guerra tributária. Sonegaram um caminhão. Uma frota de caminhões de dinheiro.
Então fizeram uma CPI na Câmara e combinaram acordos, alguns nebulosos, sem sequer avisar acionistas. Escárnio. Vá você, contribuinte, dever ISS ou IPTU à prefeitura para ver o que é bom pra gripe.
Sou a favor de cancelar todos esses acordos. Estamos numa encruzilhada. Nada será como dantes. Nada pode ser como dantes. Chega. O Covid-19 é agudo, mas nossos problemas são crônicos e devem ser tratados simultaneamente. Ah, é quebra de contrato! Sim, é. Tanto quanto quebrar patentes sobre medicamento contra a AIDS que José Serra fez quando estava na cadeira ora ocupada por Mandetta.
Outras empresas também devem marchar. A Ambev fabricou e esparramou álcool em gel. Ótimo. Mas alguém poderia fazer a conta do total de isenções que receberam na Zona Franca de Manaus para produzir água com açúcar em garrafa PET, onerando o SUS com obesidade e diabetes e o meio-ambiente com tanto plástico? Hora de devolver, senhores. Coca-Cola idem. Seria importante que o senador Tasso Jereissati (PSDB-CE), barão do xarope de Atlanta e também beneficiado, tomasse a iniciativa.
Atenção à turma da desoneração da Dilma, montadoras à frente, que acordaram descontos em troca de criar empregos e não cumpriram. Vocês também, ordinários: marchem.
E acelera, Senado, na análise da proposta de criação de imposto sobre Grandes Fortunas, que pelo texto do senador PlÃnio Valério (PSDB-AM) terá corte acima de R$ 22 milhões lÃquidos, podendo engordar o Tesouro em R$ 80 bi ao ano. Igual ao sorriso para o Mario Quintana, é Pouco para quem paga, muito para quem recebe.
Imposto sobre herança também deve ser analisado e votado logo. Ficar elogiando o êxito da Coreia do Sul em testar a população e controlar a pandemia, sem se lembrar que por lá o imposto sobre herança é de 65% e, aqui, de 4% a 8% dependendo do estado, não passa de hipocrisia.
Vamos nessa. O melhor que podemos fazer para ajudar o ministro Mandetta é ficar em casa e aproveitar o tempo livre de trânsito para pressionar os congressistas por revisões urgentes e históricas.
Como as decisões demoram a sair do papel.